Relatos do Sagrado Feminino- Nossa Senhora das Graças, rupturas e reconciliação.
Essa postagem foi construída a partir do depoimento de Alessandra. A opção do anonimato foi oferecida, porém, por tratar-se de um testemunho de espiritualidade, a autora não utilizou este recurso. O testemunho foi adaptado com a finalidade de preservar a privacidade da convidada. A postagem foi dividida em 5 partes: Introdução, Ruptura I, Ruptura II e Reconciliação divina e reconciliação humana.
Segue abaixo testemunho da convidada:
Introdução,
''Gostaria de fazer esse relato e testemunho em homenagem a que foi o modelo para todas as mães, a Virgem Maria, eu tenho isso como uma forma amorosa, humilde e singela de homenagem a ela por tudo o que ela fez, faz e ainda fará com certeza em minha vida. Por todo o ensinamento que ela me deu, durante toda minha existência e é por isso que aceitei dar esse testemunho e disponibilizá-lo. Tudo o que eu fizer em agradecimento a Nossa Senhora pelo direcionamento, pelos conselhos no silêncio da oração, tudo o que eu fizer para propagar a devoção a Nossa Senhora ainda será pouco diante de todas as graças que ela me concedeu. então, por isso eu não poderia deixar de dizer ''sim'' a esse convite.
Meu nome é Leuzalina Alessandra Silva Gomes, tenho 46 anos de idade, sou casada há 28 anos, tenho uma filha de 26 anos e minha história desde a infância foi bem conturbada, porque desde a minha concepção houve rejeição, pelo fato de minha mãe ser uma dependente química. Minha mãe aos 12 anos já fazia uso de substâncias psicoativas e por isso, minha avó teve vários problemas com ela durante a adolescência, a ponto de ela fugir várias vezes de casa e viver uma vida de prostituição e drogadição e muito cedo minha avó teve o desprazer e a dor de perder essa filha para as drogas.
Ruptura I-
Em um dos programas que minha mãe fez ela acabou engravidando de mim, fui concebida nesse momento, obviamente uma gravidez indesejada. Ela era uma mulher muito bonita aos 17 anos, estava no auge de suas atividades e minha existência era um obstáculo. Então houve uma rejeição total dessa gravidez, inclusive tentou tomar alguns abortivos mas não houve êxito, chegou a dizer para minha avó que no momento em que desse a luz, se minha avó não fosse me buscar eu seria entregue para a primeira pessoa que ela visse pela rua pois ela precisava retornar as atividades habituais. E assim aconteceu: minha mãe teve as dores do parto, foi para a maternidade e minha avó, receosa em função da abstinência pelos poucos dias que ela passou na maternidade, foi ao hospital e me buscou, me criou. Eu não tive sequer a oportunidade de ser amamentada por minha mãe. Minha avó comenta que aos 3 dias de vida saí da maternidade nos braços dela e então eles me adotaram.
Ruptura I-
Em um dos programas que minha mãe fez ela acabou engravidando de mim, fui concebida nesse momento, obviamente uma gravidez indesejada. Ela era uma mulher muito bonita aos 17 anos, estava no auge de suas atividades e minha existência era um obstáculo. Então houve uma rejeição total dessa gravidez, inclusive tentou tomar alguns abortivos mas não houve êxito, chegou a dizer para minha avó que no momento em que desse a luz, se minha avó não fosse me buscar eu seria entregue para a primeira pessoa que ela visse pela rua pois ela precisava retornar as atividades habituais. E assim aconteceu: minha mãe teve as dores do parto, foi para a maternidade e minha avó, receosa em função da abstinência pelos poucos dias que ela passou na maternidade, foi ao hospital e me buscou, me criou. Eu não tive sequer a oportunidade de ser amamentada por minha mãe. Minha avó comenta que aos 3 dias de vida saí da maternidade nos braços dela e então eles me adotaram.
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Sara De Yong Fine Arts |
Então essa foi a primeira etapa de uma ruptura, de um trauma muito grande, acredito que essa ruptura materna me fez ter uma grande rejeição do sagrado feminino durante muitos anos. No decorrer de minha criação e formação, eu tinha ensinamentos, valores e tinha uma crença muito grande em Deus Pai, mas pela virgem Maria, a Nossa Senhora havia uma dificuldade de aceitação no meu íntimo, mesmo que eu tentasse não externar isso para as pessoas.
A casa de meus avós era um terreiro de umbanda, então havia grande circulação de pessoas que eram atendidas por um tio, era como se morássemos em uma casa pública. Dentre as crianças criadas por minha avó, eu era a única menina e lá pelos 12 a 13 anos comecei a descobrir a minha feminilidade e conheci um rapaz, me apaixonei, nosso namoro era bastante inocente, mas esse foi meu primeiro despertar, a paixão da adolescência. O namoro era escondido e eu ia vê-lo em momentos de distração dos familiares.
Em um dia, quando todos estavam entretidos eu saí de fininho, cerca de uma hora depois, vi minha avó vindo em minha direção com um cinto na mão, ela estava muito nervosa. Minha criação era antiga, bastante autoritária. Eu apanhei da esquina até em casa na frente de todas as pessoas, esse acontecimento foi bastante traumático. Minha avó ficou muito abalada com minha atitude de enganá-la e passou a temer que algo acontecesse comigo, nesse caso ela seria a responsável. Em comum acordo com meu avô eles decidiram me devolver para minha mãe biológica.
Ruptura II-
A essa altura, eu sempre havia morado no norte do país com meus avós, e minha mãe biológica vivia em Brasília. A partir daquele dia, em menos de um mês eles arrumaram todas as minhas coisas e minha avó me trouxe para Brasília de mala e cuia e foi outra ruptura muito grande da parte materna. Eu não queria de forma alguma viver com minha mãe, ela era mais uma irmã que uma mãe, pois eu nunca convivi com ela, até aquele momento todo o carinho e afeição que eu tinha era por minha avó. Viver com uma pessoa estranha me causava certo desespero.
Minha avó me deixou na casa de minha mãe biológica, em Brasília e após dois dias foi embora. Durante trajeto de vinda, eu chorava e suplicava para que minha avó não me abandonasse, que não me deixasse, não fizesse isso comigo, prometi que jamais faria aquilo outra vez. Minha avó também sofreu muito, foi muito dolorido para ambas as partes, mas já estava decidido.
Aos 13, 14 anos passei a viver com minha mãe biológica e observei que a casa era muito estranha, passado pouco tempo eu pude constatar que aquele era um ponto de uso e venda de entorpecentes, esse foi um problema imenso para administrar.
Mesmo com tão pouca idade, a única coisa que eu queria era não ter aquela mesma vivência, então arrumei uma estratégia para não ficar em casa, ocupar todo o meu tempo e ir apenas dormir. Comecei a me envolver com esportes, aquela foi a minha tábua de salvação, passei a fazer jazz e ballet clássico, alguns conhecidos da escola participavam das mesmas atividades de dança e paralelamente passei a procurar um emprego.
Mais ou menos aos 17 anos arrumei o primeiro emprego. Minha rotina fora de casa era meu refúgio para não me envolver naquele contexto, foi bastante complicado administrar tudo isso. Eu negligenciava minha identidade mais íntima, mais pessoal, me desvincilhava do assunto quando as pessoas queriam me visitar em casa, quando levava alguém era muito rápido, apenas de passagem. Era muito vergonhoso admitir que eu tinha uma mãe dependente química e que vivia no mundo do crime, ela tinha um marido, também usuário de drogas e eu tinha uma irmã mais nova. Fazia o máximo possível para não me envolver, até porque não havia a questão do afeto, da partilha familiar, viviam mais em prol das viagens, minha irmã era criada basicamente pelas pessoas que minha mãe contratava para cuidar da casa.
Nesse período com 17,18 anos conheci meu marido e me apaixonei pela segunda vez. Fantasiei tudo o que uma pessoa apaixonada fantasia: ''todos os meus problemas estão resolvidos, terei minha família, unida, estruturada.'' Mas não foi bem assim, houve outros percalços.
Após um ano de relacionamento, de namoro, engravidei de nossa filha, hoje com 26 anos. Depois de um tempo e muitas dificuldades constatei que ele também tinha problemas com dependência química, então passei a lidar com dois dependentes químicos. Essa constatação foi muito dolorosa.
Nesse momento eu me voltei de fato para a espiritualidade e busquei forças em deus para superar toda essa dificuldade. Mas o lado sagrado feminino -que era a questão de nossa senhora- sempre pesava muito então eu não buscava de fato esse aconchego no colo da mãe. Passei por várias denominações religiosas: fui protestante, espirita, sempre pedi a D'us que Jesus na sua infinita misericórdia me mostrasse a religião que Ele havia criado para que eu seguisse de fato e eu fui cada vez mais me deixando levar pela mão d'Ele naquele processo, em todas as minhas dores.
Até que um dia, meu marido chegou em casa caindo pelas tabelas, como se diz. Eu saía de casa 4:30 da manhã para trabalhar e levava minha filha para a escola, chegávamos por volta das 20h 21h. Num desses dias, na volta meu marido muito debilitado pelo uso diário do álcool e de outras drogas estava cambaleando pelos corredores de casa. Aquilo para mim foi a gota d'água, no cansaço que eu já estava, praticamente no fim da semana, ao olhar para ele balancei a cabeça negativamente, entrei no quarto, tomei um banho e chorei durante toda a noite e desabafei para D'us que estava sendo muito doloroso persistir naquela vida tão doída e difícil. Nesse choro compulsivo eu adormeci.
Reconciliação divina:
E nessa noite acabei tendo um sonho com nossa senhora.
Nossa senhora estava suspensa, de suas mãos saíam raios e ela me falava ''filha, eu sei que você tem dificuldades para vir até mim, mas eu quero que você tenha certeza de que é minha filha. E que independente de qualquer coisa eu sou sua mãe, então peça por mim, eu estarei contigo, eu sou a sua mãe.'' Então acordei no meio da madrugada bastante assustada com aquela experiência que parecia tão real, aquela experiência mexeu muito comigo.
Durante esse sonho ela recitava o ofício de nossa senhora, depois daquele momento, inexplicavelmente, eu sei recitar o ofício, que não é pequeno. Essa é a prova de que houve uma conexão com o sagrado materno real. Eu jamais li o ofício mas o sei de cor.
A partir dali, houve um trabalho de estudo e aceitação sobre quais as qualidades e importância dessa mulher na vida de seu filho, o que ela tinha a me oferecer, a me ensinar naquele momento de dor. A partir de todo esse estudo eu me rendi a Nossa Senhora e de fato eu busquei na escola de Maria as virtudes necessárias para sobreviver a toda essa dificuldade que a vida por si só havia me mostrado.
Ela de fato me deu as ferramentas necessárias para vencer as dificuldades, quando me deparava com as situações pensava ''como nossa senhora agiria, se estivesse aqui em meu lugar?''
Nossa Senhora me inspirava em suas poucas e fortes aparições na história da humanidade.
Isso foi de uma importância tamanha , alavancou minha vida espiritual de tal maneira. que me me empoderou a ponto de não mais ficar vendo a minha história passar, mas fazer parte de minha história de forma afetiva e ativa, tomando medidas concretas para que aquela realidade pudesse mudar. Eu deixei de ser coadjuvante e passei a ter o papel principal de minha vida, partindo dos ensinamentos que eu ia vivenciando através da oração, do aprendizado, das coisas que nossa senhora me ensinou ao longo dessa caminhada. Foram várias situações muito difíceis.
As maiores virtudes e ensinamentos eu aprendi na faculdade da Virgem Maria, os valores que ela me ensinou eu jamais vou aprender em nenhum outro lugar e são eternos.
III-Reconciliação humana.
A matéria vai passar, tudo é temporário e muito rápido, o que se eterniza é o que vale a pena. Continuo sendo uma pessoa frágil e falha, mas hoje com muito mais consciência e sabedoria e humildade e silêncio e clareza de que sou humana, pecadora mas que eu não preciso me conformar com determinadas situações e que eu posso fazer a diferença. E que não será ser um mero diploma que vai me fazer chegar onde quero, mas sim as sementes e os rastros de D'us que eu deixei com minha história com as pessoas que eu amei e o bem que eu fiz ao próximo e hoje eu vivo para isso.
Durante toda essa trajetória da escola, da universidade de maria ela me ensina todos os dias a servir no silêncio, na humildade, me ensina que o simples o pouco é o fundamental e o essencial e que a simplicidade é a mãe das virtudes e de todas as graças e que vai nos levar de fato a felicidade plena.
Uma dessas conquistas, foi poder há 9 anos atrás, quando eu estava com 36 anos, poder preparar a minha mãe para voltar aos braços de Jesus pelos braços de Nossa Senhora. Foi uma das coisas mais importantes que Nossa Senhora me ensinou, que tudo é passageiro e que essa vida é um sopro, mas o que precisamos fazer deve ser feito com intensidade, amar tudo o que fazemos é fundamental.
Após muitos anos de afastamento comecei a buscar uma reconciliação com minha mãe, de maneira insistente busquei um estreitamento de nossa relação, eu não me sentia mais culpada pelo estilo de vida que minha mãe levava. Eu estava consciente que havia feito tudo o que podia, e que era necessário que ela quisesse abandonar as drogas, isso não dependia de mim. Atualmente, após diversas formações, trabalho diretamente com famílias com a mesma dificuldade, na pastoral da sobriedade.
Minha mãe acabou sendo presa por seus delitos, ficou um ano detida e após 6 meses ela ficou muito doente e depois de certo tempo nos ligaram dizendo que ela havia sido transferida para o hospital muito adoecida. O médico pediu para que eu reunisse as pessoas mais próximas para nos despedirmos, minha mãe era soropositiva e estava em estado terminal, a vida insalubre na prisão potencializou os danos causados pelo vírus. Acredito que ela já tinha conhecimento da doença mas por vergonha, ela negligenciou o próprio tratamento e escondeu da família.
Esse foi outro momento crucial, aprendi dentro da faculdade de Maria e na pastoral da sobriedade, o passo ''reparar'' -dentre 12 passos- eu precisava reparar muitas coisas naquele dia com minha mãe, nós precisávamos reparar as nossas arestas antes que ela partisse.
Implorei para os médicos, os coordenadores do hospital para que eu ficasse, acredito que houve intervenção divina, pois, diante de meu relato eles permitiram que eu passasse a noite naquela UTI. Naquela noite eu pude reparar tudo o que não havíamos reparado em 36 anos.
Naquela noite eu pude colocar a minha mãe em meus braços
Naquela noite eu pude dizer para minha mãe o quanto eu a amava
Naquela noite eu pude pedir perdão para minha mãe por todas as vezes que eu havia sentido vergonha de tê-la como mãe, eu pude perdoá-la por toda a ausência eu pude perdoá-la por toda a falta que ela me fez durante toda a minha vida, por todo o abandono, por toda a negligência.
Foi uma noite linda onde nós pudemos nos perdoar e nos amar mutuamente.
Ela não podia falar, mas eu pedia sinais, ela compreendia e lágrimas escorriam de seus olhos, eu pude dar banho na minha mãe como uma mãe dá banho em seu filho quando é pequenininho, eu tive a oportunidade de cuidar da minha mãe como eu gostaria que ela tivesse cuidado de mim. Deus me deu pela força e pela intercessão de Nossa Senhora a graça de ter vivenciado tudo isso antes da partida da minha mãe, e eu tive 24 horas para resgatar o que eu não tinha resgatado em 36 anos e nós nos amamos muito nessa noite e nesse dia.
Depois disso chamei um sacerdote e ele deu a ela a extrema unção, e ele a abençoou, após esse momento tão humano e tão divino ao mesmo tempo minha mãe faleceu em meus braços. E foi o momento mais lindo que eu já vivenciei, porque era um momento de partida e dor, mas um momento de muita felicidade.
Eu sabia que estava perdendo a mãe carnal, mas que sua parte divina e eterna eu havia conseguido preservar através do amor, através do perdão. Eu tinha certeza que ela estava partindo em paz. Isso foi o maior consolo, isso sobrepôs toda a dor.
Eu sinto saudade mas sei que estamos muito unidas de alma por tudo o que vivenciamos espiritualmente.
Então, valeu muito a pena entrar na escola de Nossa Senhora, foi ela que me deu toda essa força e toda essa serenidade para conseguir me colocar no lugar de minha mãe.
Hoje meu marido está completamente recuperado, nós trabalhamos juntos na pastoral da sobriedade ajudando outras famílias a lidarem com a questão da dependência e da co-dependência que inclui os familiares.
*A postagem foi escrita a partir da transcrição de áudios enviados por Alessandra.
**Procure acolher a história de maneira empática, lembre-se que a pessoa pode estar lendo seus comentários e isso a afeta diretamente.
Caso você deseje postar sua história de encontro com o Sagrado Feminino pode enviar e-mail para museudadoula@hotmail.com existe a opção do anonimato.
A casa de meus avós era um terreiro de umbanda, então havia grande circulação de pessoas que eram atendidas por um tio, era como se morássemos em uma casa pública. Dentre as crianças criadas por minha avó, eu era a única menina e lá pelos 12 a 13 anos comecei a descobrir a minha feminilidade e conheci um rapaz, me apaixonei, nosso namoro era bastante inocente, mas esse foi meu primeiro despertar, a paixão da adolescência. O namoro era escondido e eu ia vê-lo em momentos de distração dos familiares.
Em um dia, quando todos estavam entretidos eu saí de fininho, cerca de uma hora depois, vi minha avó vindo em minha direção com um cinto na mão, ela estava muito nervosa. Minha criação era antiga, bastante autoritária. Eu apanhei da esquina até em casa na frente de todas as pessoas, esse acontecimento foi bastante traumático. Minha avó ficou muito abalada com minha atitude de enganá-la e passou a temer que algo acontecesse comigo, nesse caso ela seria a responsável. Em comum acordo com meu avô eles decidiram me devolver para minha mãe biológica.
Ruptura II-
A essa altura, eu sempre havia morado no norte do país com meus avós, e minha mãe biológica vivia em Brasília. A partir daquele dia, em menos de um mês eles arrumaram todas as minhas coisas e minha avó me trouxe para Brasília de mala e cuia e foi outra ruptura muito grande da parte materna. Eu não queria de forma alguma viver com minha mãe, ela era mais uma irmã que uma mãe, pois eu nunca convivi com ela, até aquele momento todo o carinho e afeição que eu tinha era por minha avó. Viver com uma pessoa estranha me causava certo desespero.
Minha avó me deixou na casa de minha mãe biológica, em Brasília e após dois dias foi embora. Durante trajeto de vinda, eu chorava e suplicava para que minha avó não me abandonasse, que não me deixasse, não fizesse isso comigo, prometi que jamais faria aquilo outra vez. Minha avó também sofreu muito, foi muito dolorido para ambas as partes, mas já estava decidido.
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Claudia Tremblay Fine Arts |
Aos 13, 14 anos passei a viver com minha mãe biológica e observei que a casa era muito estranha, passado pouco tempo eu pude constatar que aquele era um ponto de uso e venda de entorpecentes, esse foi um problema imenso para administrar.
Mesmo com tão pouca idade, a única coisa que eu queria era não ter aquela mesma vivência, então arrumei uma estratégia para não ficar em casa, ocupar todo o meu tempo e ir apenas dormir. Comecei a me envolver com esportes, aquela foi a minha tábua de salvação, passei a fazer jazz e ballet clássico, alguns conhecidos da escola participavam das mesmas atividades de dança e paralelamente passei a procurar um emprego.
Mais ou menos aos 17 anos arrumei o primeiro emprego. Minha rotina fora de casa era meu refúgio para não me envolver naquele contexto, foi bastante complicado administrar tudo isso. Eu negligenciava minha identidade mais íntima, mais pessoal, me desvincilhava do assunto quando as pessoas queriam me visitar em casa, quando levava alguém era muito rápido, apenas de passagem. Era muito vergonhoso admitir que eu tinha uma mãe dependente química e que vivia no mundo do crime, ela tinha um marido, também usuário de drogas e eu tinha uma irmã mais nova. Fazia o máximo possível para não me envolver, até porque não havia a questão do afeto, da partilha familiar, viviam mais em prol das viagens, minha irmã era criada basicamente pelas pessoas que minha mãe contratava para cuidar da casa.
Nesse período com 17,18 anos conheci meu marido e me apaixonei pela segunda vez. Fantasiei tudo o que uma pessoa apaixonada fantasia: ''todos os meus problemas estão resolvidos, terei minha família, unida, estruturada.'' Mas não foi bem assim, houve outros percalços.
Após um ano de relacionamento, de namoro, engravidei de nossa filha, hoje com 26 anos. Depois de um tempo e muitas dificuldades constatei que ele também tinha problemas com dependência química, então passei a lidar com dois dependentes químicos. Essa constatação foi muito dolorosa.
Nesse momento eu me voltei de fato para a espiritualidade e busquei forças em deus para superar toda essa dificuldade. Mas o lado sagrado feminino -que era a questão de nossa senhora- sempre pesava muito então eu não buscava de fato esse aconchego no colo da mãe. Passei por várias denominações religiosas: fui protestante, espirita, sempre pedi a D'us que Jesus na sua infinita misericórdia me mostrasse a religião que Ele havia criado para que eu seguisse de fato e eu fui cada vez mais me deixando levar pela mão d'Ele naquele processo, em todas as minhas dores.
Até que um dia, meu marido chegou em casa caindo pelas tabelas, como se diz. Eu saía de casa 4:30 da manhã para trabalhar e levava minha filha para a escola, chegávamos por volta das 20h 21h. Num desses dias, na volta meu marido muito debilitado pelo uso diário do álcool e de outras drogas estava cambaleando pelos corredores de casa. Aquilo para mim foi a gota d'água, no cansaço que eu já estava, praticamente no fim da semana, ao olhar para ele balancei a cabeça negativamente, entrei no quarto, tomei um banho e chorei durante toda a noite e desabafei para D'us que estava sendo muito doloroso persistir naquela vida tão doída e difícil. Nesse choro compulsivo eu adormeci.
Reconciliação divina:
E nessa noite acabei tendo um sonho com nossa senhora.
Nossa senhora estava suspensa, de suas mãos saíam raios e ela me falava ''filha, eu sei que você tem dificuldades para vir até mim, mas eu quero que você tenha certeza de que é minha filha. E que independente de qualquer coisa eu sou sua mãe, então peça por mim, eu estarei contigo, eu sou a sua mãe.'' Então acordei no meio da madrugada bastante assustada com aquela experiência que parecia tão real, aquela experiência mexeu muito comigo.
Durante esse sonho ela recitava o ofício de nossa senhora, depois daquele momento, inexplicavelmente, eu sei recitar o ofício, que não é pequeno. Essa é a prova de que houve uma conexão com o sagrado materno real. Eu jamais li o ofício mas o sei de cor.
A partir dali, houve um trabalho de estudo e aceitação sobre quais as qualidades e importância dessa mulher na vida de seu filho, o que ela tinha a me oferecer, a me ensinar naquele momento de dor. A partir de todo esse estudo eu me rendi a Nossa Senhora e de fato eu busquei na escola de Maria as virtudes necessárias para sobreviver a toda essa dificuldade que a vida por si só havia me mostrado.
Ela de fato me deu as ferramentas necessárias para vencer as dificuldades, quando me deparava com as situações pensava ''como nossa senhora agiria, se estivesse aqui em meu lugar?''
Nossa Senhora me inspirava em suas poucas e fortes aparições na história da humanidade.
Isso foi de uma importância tamanha , alavancou minha vida espiritual de tal maneira. que me me empoderou a ponto de não mais ficar vendo a minha história passar, mas fazer parte de minha história de forma afetiva e ativa, tomando medidas concretas para que aquela realidade pudesse mudar. Eu deixei de ser coadjuvante e passei a ter o papel principal de minha vida, partindo dos ensinamentos que eu ia vivenciando através da oração, do aprendizado, das coisas que nossa senhora me ensinou ao longo dessa caminhada. Foram várias situações muito difíceis.
As maiores virtudes e ensinamentos eu aprendi na faculdade da Virgem Maria, os valores que ela me ensinou eu jamais vou aprender em nenhum outro lugar e são eternos.
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III-Reconciliação humana.
A matéria vai passar, tudo é temporário e muito rápido, o que se eterniza é o que vale a pena. Continuo sendo uma pessoa frágil e falha, mas hoje com muito mais consciência e sabedoria e humildade e silêncio e clareza de que sou humana, pecadora mas que eu não preciso me conformar com determinadas situações e que eu posso fazer a diferença. E que não será ser um mero diploma que vai me fazer chegar onde quero, mas sim as sementes e os rastros de D'us que eu deixei com minha história com as pessoas que eu amei e o bem que eu fiz ao próximo e hoje eu vivo para isso.
Durante toda essa trajetória da escola, da universidade de maria ela me ensina todos os dias a servir no silêncio, na humildade, me ensina que o simples o pouco é o fundamental e o essencial e que a simplicidade é a mãe das virtudes e de todas as graças e que vai nos levar de fato a felicidade plena.
Uma dessas conquistas, foi poder há 9 anos atrás, quando eu estava com 36 anos, poder preparar a minha mãe para voltar aos braços de Jesus pelos braços de Nossa Senhora. Foi uma das coisas mais importantes que Nossa Senhora me ensinou, que tudo é passageiro e que essa vida é um sopro, mas o que precisamos fazer deve ser feito com intensidade, amar tudo o que fazemos é fundamental.
Após muitos anos de afastamento comecei a buscar uma reconciliação com minha mãe, de maneira insistente busquei um estreitamento de nossa relação, eu não me sentia mais culpada pelo estilo de vida que minha mãe levava. Eu estava consciente que havia feito tudo o que podia, e que era necessário que ela quisesse abandonar as drogas, isso não dependia de mim. Atualmente, após diversas formações, trabalho diretamente com famílias com a mesma dificuldade, na pastoral da sobriedade.
Minha mãe acabou sendo presa por seus delitos, ficou um ano detida e após 6 meses ela ficou muito doente e depois de certo tempo nos ligaram dizendo que ela havia sido transferida para o hospital muito adoecida. O médico pediu para que eu reunisse as pessoas mais próximas para nos despedirmos, minha mãe era soropositiva e estava em estado terminal, a vida insalubre na prisão potencializou os danos causados pelo vírus. Acredito que ela já tinha conhecimento da doença mas por vergonha, ela negligenciou o próprio tratamento e escondeu da família.
Esse foi outro momento crucial, aprendi dentro da faculdade de Maria e na pastoral da sobriedade, o passo ''reparar'' -dentre 12 passos- eu precisava reparar muitas coisas naquele dia com minha mãe, nós precisávamos reparar as nossas arestas antes que ela partisse.
Implorei para os médicos, os coordenadores do hospital para que eu ficasse, acredito que houve intervenção divina, pois, diante de meu relato eles permitiram que eu passasse a noite naquela UTI. Naquela noite eu pude reparar tudo o que não havíamos reparado em 36 anos.
Naquela noite eu pude colocar a minha mãe em meus braços
Naquela noite eu pude dizer para minha mãe o quanto eu a amava
Naquela noite eu pude pedir perdão para minha mãe por todas as vezes que eu havia sentido vergonha de tê-la como mãe, eu pude perdoá-la por toda a ausência eu pude perdoá-la por toda a falta que ela me fez durante toda a minha vida, por todo o abandono, por toda a negligência.
Foi uma noite linda onde nós pudemos nos perdoar e nos amar mutuamente.
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Ela não podia falar, mas eu pedia sinais, ela compreendia e lágrimas escorriam de seus olhos, eu pude dar banho na minha mãe como uma mãe dá banho em seu filho quando é pequenininho, eu tive a oportunidade de cuidar da minha mãe como eu gostaria que ela tivesse cuidado de mim. Deus me deu pela força e pela intercessão de Nossa Senhora a graça de ter vivenciado tudo isso antes da partida da minha mãe, e eu tive 24 horas para resgatar o que eu não tinha resgatado em 36 anos e nós nos amamos muito nessa noite e nesse dia.
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Claudia Tremblay Fine Arts |
Depois disso chamei um sacerdote e ele deu a ela a extrema unção, e ele a abençoou, após esse momento tão humano e tão divino ao mesmo tempo minha mãe faleceu em meus braços. E foi o momento mais lindo que eu já vivenciei, porque era um momento de partida e dor, mas um momento de muita felicidade.
Eu sabia que estava perdendo a mãe carnal, mas que sua parte divina e eterna eu havia conseguido preservar através do amor, através do perdão. Eu tinha certeza que ela estava partindo em paz. Isso foi o maior consolo, isso sobrepôs toda a dor.
Eu sinto saudade mas sei que estamos muito unidas de alma por tudo o que vivenciamos espiritualmente.
Então, valeu muito a pena entrar na escola de Nossa Senhora, foi ela que me deu toda essa força e toda essa serenidade para conseguir me colocar no lugar de minha mãe.
Hoje meu marido está completamente recuperado, nós trabalhamos juntos na pastoral da sobriedade ajudando outras famílias a lidarem com a questão da dependência e da co-dependência que inclui os familiares.
*A postagem foi escrita a partir da transcrição de áudios enviados por Alessandra.
**Procure acolher a história de maneira empática, lembre-se que a pessoa pode estar lendo seus comentários e isso a afeta diretamente.
Caso você deseje postar sua história de encontro com o Sagrado Feminino pode enviar e-mail para museudadoula@hotmail.com existe a opção do anonimato.
Fantástico relato sofrido mais vitoriosos pela fé, parabéns Alessandra, você é uma guerreira e que Deus abençoe, parabéns e obrigado por compartilhar sua "vida" conosco, grande abraço!
ResponderExcluirFoi lindo o depoimento da Alessandra, e eu tive o privilégio de presencia lo, mas também foi muito emocionante!Parabéns Ale, pela coragem, e sua fé inabalável!!
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